quinta-feira, 18 de junho de 2009

Inconstitucionalidade da Prorrogação dos Contratos Temporários

A Lei prevê os casos de contratação de temporário nas três esferas do Poder, a dizer: Legislativo, Executivo e Judiciário, todavia, em vários Estados Brasileiros temos observado uma prática vergonhosa de prorrogação sucessivas de tais contratos, o que, indubitavelmente, burla a exigência constitucional de realização de concurso público para ingresso no Serviço Público.

Ora, além de estarem indo de encontro à Constituição Federal, dada a flagrante inconstitucionalidade das Legislações que "autorizam" a perpetuação dos Temporários no quadro de pessoal da Administração Pública, fere também a Lei de Improbridade Administrativa, todavia, até então, não se sabe notícia de algum Governante ter sido punido em razão disso.

O Estado do Pará é um "belo" exemplo nacional, pois, desde 1991 se tem temporários no Estado, porém, ainda que se tenha tentado punir os Governantes responsáveis pela "eternas" prorrogações, todos estão impunes. Mas veja que em noss país, alguém que furte um pacote de leite para se alimentar, configurando-se crime famélico, passa dias presos e até meses em uma delegacia.

Enquanto isso, milhares de pessoas que poderiam ingressar no Serviço Público, ficam a mercê das conveniências e oportunidades dos Políticos que elas mesmas elegem, sob a justificava de que tais iriam defender o interesse do povo. É uma vegonha que o critério ainda seja o do "mais chegado" e não o do mais capaz tecnicamente para ocupar determinado cargo na Administração Pública.

Temporários de Belém do Pará

Os ilustres vereadores Joaquim Passarinho (Presidente da Câmara Municipal de Belém) e Sahid Xerfan (Presidente da Comissão de Constituição e Justiça) fizeram publicar, no O Liberal do último dia 22, um texto intitulado “Infeliz Comparação”, no qual procuraram justificar a indefinida prorrogação dos contratos dos temporários municipais, e a permanência desses servidores sob o regime do IPAMB, o que vem sendo discutido pela Câmara em polêmico projeto que comentei no meu artigo “A Lei Bararú do Município”, publicado no dia 19.
Suas Excelências acharam “infeliz” a minha comparação entre as leis municipais e a “Lei Bararú”, que de acordo com as suas próprias palavras, “teve o condão de efetivar os servidores temporários da Assembléia Legislativa do Estado”.
Mas no meu entendimento, as leis municipais são mesmo idênticas às leis estaduais, e a comparação não foi, absolutamente, infeliz, porque as leis municipais também ensejaram, como as diversas “Leis Bararú”, a indefinida prorrogação dos contratos temporários, desde 1.989 e, até mesmo, a pretensa “efetivação” desses servidores, em detrimento do princípio constitucional do concurso público.
Mas Suas Excelências criticaram, inicialmente, a utilização que eu teria feito, do nome do deputado Bararú, “para banalizar, nos jornais, a iniciativa parlamentar de um deputado eleito legitimamente pela maioria do voto democrático dos cidadãos deste Estado, em pleno exercício de seu mandato”.
Desejo dizer, em minha defesa, que não pretendi, de maneira alguma, atingir pessoalmente o referido deputado, que aliás não foi o único a defender a efetivação dos temporários estaduais, porque a decisão da Assembléia Legislativa foi unânime. Da mesma forma, também não pretendi atingir pessoalmente os ilustres vereadores, com o meu artigo “A Lei Bararú do Município”.
Informo, ainda, que se eu usei essa expressão “Lei Bararú”, não foi para “banalizar” o nome do deputado, mas apenas porque ela já se tornou corriqueira nos meios parlamentares e na imprensa, em virtude da destacada atuação que aquele deputado teve na aprovação das leis estaduais que desde 1.991 pretenderam beneficiar os temporários.
Em meus artigos, procuro sempre desenvolver argumentos jurídicos, embora os ilustres vereadores tenham dito que preferem “ficar com o social”, o que reforça ainda mais a comparação que fiz entre as leis estaduais e as municipais, porque também a Assembléia Legislativa procurou se justificar, há alguns meses, alegando a necessidade de evitar um sério problema social, com o desemprego dos temporários.
Esquecem, tanto os parlamentares municipais como os estaduais, que a Constituição exige o concurso público e que todos os desempregados têm o direito de se submeter aos concursos públicos, em igualdade de condições com os servidores temporários.
Também fui acusado de “interpretar a lei segundo os meus próprios interesses, ou os de quem melhor me remunere”. A esse tipo de argumento, prefiro nem responder.
Mas os ilustres vereadores, em sua tentativa de justificar a situação dos temporários municipais, desenvolveram a seguir uma série de argumentos relacionados, em sua maioria, com a mudança do regime celetista para o regime estatutário, o que na verdade nada justifica, do ponto de vista jurídico, porque essas considerações não servem para afastar a exigência constitucional do concurso público.
Na verdade, não importa que o servidor seja celetista, e que o Município elabore uma lei dizendo que todos os celetistas serão enquadrados como estatutários. O que importa é que esses servidores tenham sido aprovados em concurso público, e não em concurso interno, como pretende o parágrafo 2º do artigo 1º da Lei 7.453, de 05.07.1989.
Mas, continuando com a sua argumentação, os vereadores falaram a respeito dessa Lei, que instituiu o Regime Jurídico Único, e disseram que ela foi sancionada em 14.01.1991, pelo Prefeito Augusto Rezende, o que não é, absolutamente, verdade, mesmo porque, se a lei é de 05.07.1989, é porque ela foi sancionada em 05.07.1989. Na realidade, qualquer projeto de lei, já aprovado pela Câmara, se transformará em lei através da sanção do Prefeito. A não ser, evidentemente, nos casos de veto e rejeição do veto. Portanto, a lei 7.543 não foi sancionada pelo Prefeito Rezende, em 1.991, mas pelo Prefeito Xerfan, em 1.989. Basta conferir na página da Prefeitura, na internet, no endereço (http://www.belem.pa.gov.br/leis/1989/lei-7453.htm).
Esclareço, no entanto, que não estou aqui fazendo nenhuma acusação ao hoje vereador Xerfan, mesmo porque o projeto que ele sancionou, como prefeito, em 1.989, já havia sido votado e aprovado pela Câmara Municipal, e ele apenas deixou de utilizar a prerrogativa do veto, porque não achou que essa lei fosse inconstitucional ou contrária ao interesse público. Não estou acusando, repito. Trata-se de uma simples constatação: essa lei é de 05.07.1989, e assim não poderia ter sido sancionada em 14.01.1991, como eles afirmam.
Na data que os ilustres vereadores referiram, ou seja, 14.01.1991, foi sancionada, esta sim, pelo Prefeito Augusto Rezende, a lei nº 7.507, que dispõe sobre o Plano de Carreira do Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Belém, e dá outras providências. Basta conferir na página da Prefeitura, na internet, no endereço (http://www.belem.pa.gov.br/leis/1991/lei-7507.htm).
Existe ainda a Lei nº 7.502, de 20.12.1990, que dispõe sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Belém, e que somente foi publicada em 08.05.1991 (http://www.belem.pa.gov.br/leis/1990/lei-7502.htm).
Mas os ilustres vereadores afirmaram, também, que “a União editou a Lei 8.112, de 11.12.1990 e o município adotou-a como modelo, adaptando seus comandos para a esfera municipal através da lei 7.453/89”. Na minha opinião, isso seria impossível, porque com certeza o legislador municipal não poderia conhecer, em 05.07.1989, uma lei federal que ainda iria ser editada, em 11.12.1990, ou seja, um ano e cinco meses depois. A não ser com alguma ajuda do sobrenatural, ou com a contratação, pela Câmara, de algum vidente, para o desempenho de funções temporárias de excepcional interesse público.
Disseram eles, ainda, que essa lei “não efetivou temporários; muito pelo contrário, determinou expressamente que todos aqueles não admitidos na forma do artigo 37 II da CF com menos de cinco anos na data da promulgação da Lei Maior fossem submetidos a concurso público”, o que não deixa de ser verdade, porque essa norma consta do parágrafo 1o do artigo 1o da Lei 7.453/89. Mas uma verdade truncada, porque eles esqueceram de comentar o parágrafo 2o do mesmo artigo: “Para aplicação do disposto no parágrafo 1°, proceder-se-á Concurso Interno, precedido de período de capacitação profissional estipulado pelos respectivos Órgãos da Administração”. Esqueceram de nos dizer, também, se esses concursos internos já foram realizados, porque afinal de contas, mais de treze anos já se passaram, desde a edição dessa lei.
Disseram, também, que a contratação de pessoal temporário, prevista nessa lei, “longe de constituir uma imoralidade ou um descalabro, é na verdade uma necessidade da administração pública para atender as hipóteses de caráter excepcional”, o que também é verdade, mas por seis meses, apenas, conforme dispõe a Constituição Federal.
Ou será que eles querem dizer que esse caráter excepcional pode ser prolongado por treze anos, como vem ocorrendo?
Afinal, quantos anos mais serão necessários para os preparativos de um concurso público? Para a Constituição Federal, pelo menos, um ano já seria mais do que suficiente.
Em seguida, os ilustres vereadores afirmaram que a Câmara Municipal não possui servidores temporários, “nem no sentido lato e nem no sentido jurídico da palavra”, porque “sua relação com a Câmara não é transitória, temporânea ou provisória” e porque foram contratados, antes da Constituição de 1.988, em caráter permanente, sob o regime da CLT.
Embora eu desconheça a distinção entre os conceitos de servidor temporário em sentido lato e servidor temporário em sentido jurídico, que eles utilizam, posso afirmar com certeza que, mesmo antes da Constituição de 1.988, isso não poderia ocorrer, porque já havia a exigência do concurso público. Esses servidores municipais não poderiam ser contratados, sem concurso público, “em caráter permanente”, mesmo sob o regime da CLT. E tanto isso é verdade, que a norma transitória do art. 19 do ADCT da Constituição Federal de 1.988 considerou estáveis apenas os não concursados que já tivessem cinco anos de exercício no cargo, em 05.10.1988. Os outros temporários estariam sujeitos ao concurso público, em igualdade de condições com todos os candidatos inscritos.
A Constituição de 1.988 não fez, a esse respeito, qualquer distinção, entre os estatutários e os celetistas. Seria até absurdo que ela o fizesse, porque isso anularia a finalidade do concurso público prestado pelo estatutário, de vez que assim o celetista não concursado teria exatamente os mesmos direitos.
Na verdade, a Constituição de 1.967, no parágrafo 1o do artigo 97, já exigia a prévia aprovação em concurso público de provas, ou de provas e títulos, para a primeira investidura em cargo público. Ora, havendo a dualidade de regimes, os cargos públicos poderiam ser estatutários ou celetistas, mas a Constituição não exigia o concurso apenas para os cargos estatutários. A norma era muito clara. Seria impossível, portanto, que os servidores da Câmara Municipal tivessem sido “contratados, antes da Constituição de 1.988, em caráter permanente, sob o regime da CLT”, como querem Suas Excelências. A Constituição de 1.967 já exigia o concurso público.
Aliás, os abusos sempre existiram, mas o concurso público nem é uma invenção tão recente, porque o artigo 170 da Constituição de 1934 já determinava que “a primeira investidura nos postos de carreira das repartições administrativas, e nos demais que a lei determinar, efetuar-se-á depois de exame de sanidade e concurso de provas ou título.”
Não resta dúvida, portanto, de que são inconstitucionais os seguintes dispositivos das referidas leis municipais:
1) o parágrafo 2o do art. 1o da Lei 7.453/89, que mandou realizar concurso interno, para “regularizar” a situação dos temporários que tinham menos de cinco anos de serviço, em 05.10.1988: “Para aplicação do disposto no parágrafo 1°, proceder-se-á Concurso Interno, precedido de período de capacitação profissional estipulado pelos respectivos Órgãos da Administração”.
2) o parágrafo 2o do art. 13 da Lei 7.453/89, que permitiu a contratação de temporários por um ano, prorrogável por igual período: “A contratação não poderá ultrapassar o ano civil, permitida a renovação por mais um período, não superior a doze meses, caso persistam os motivos originários do ato”.
3) o parágrafo 2o do art. 162 da Lei 7.502/90, que garante a aposentadoria do servidor comissionado: “O funcionário ocupante de cargo em comissão terá direito à aposentadoria se preencher todos os requisitos deste artigo, mesmo não sendo titular de cargo efetivo, desde que tenha prestado, pelo menos, cinco anos de serviço ao Município de Belém, suas autarquias e fundações”.
4) Também o parágrafo 1o do art. 163 da Lei 7.502/90: “As vantagens definidas neste artigo são extensivas ao funcionário que, à época da aposentadoria, contar ou perfizer dez anos, consecutivos ou não, em cargo em comissão ou função gratificada.”
5) o parágrafo único do artigo 8o da Lei 7.507/91: “Os direitos assegurados no Estatuto e neste Plano de Carreira serão estendidos aos funcionários que tenham sido contratados em Regime de C.L.T., antes da promulgação da Lei Municipal 7.453, de 05 de julho de 1989”.
Pelas mesmas razões, também é inconstitucional o substitutivo apresentado pelo vereador Xerfan ao art. 6o do projeto referente ao regime previdenciário municipal, que está sendo discutido na Câmara, e que “para resguardar os direitos dos servidores temporários”, pretende estabelecer um prazo de 24 meses para a vigência desse artigo, que determina a transferência dos temporários para o regime geral da previdência social.
Aliás, cabe ressaltar que um dos motivos que têm sido alegados para o desequilíbrio das contas dos órgãos previdenciários oficiais é a facilidade com que são criadas aposentadorias “especiais”, de fantasmas, de temporários, de viúvas, ou simplesmente concedidas após quatro ou cinco anos de “trabalho”. Ao mesmo tempo, o Presidente eleito está prometendo acabar com a dualidade previdenciária, que permite a coexistência das aposentadorias de 40 mil reais, dos marajás, e de 200 reais, ou menos, do INSS.
Portanto, Suas Excelências, embora eu reconheça que isto lhes possa parecer de difícil compreensão, o meu interesse na questão dos temporários, assim como em tantos outros debates anteriores, referentes, por exemplo, ao IPTU, à taxa de iluminação pública e às pensões do IPASEP e do IPAMB, é apenas jurídico, e não monetário, ou mercenário.
O meu interesse principal, a linha comum a todas essas polêmicas, é a conclusão da minha dissertação de mestrado, cujo tema é o controle do poder, e para isso preciso entender por que não se respeita a Constituição, embora a todo momento se diga que vivemos em uma democracia.
Também pretendo explicar as diversas razões pelas quais o povo, que teoricamente é o titular do poder, depois que elege os seus governantes, tem tanta dificuldade em controlar e punir as suas ações, apesar de existirem tantos mecanismos processuais, mais do que em qualquer outro lugar no Mundo, e apesar de contarmos com tantos órgãos fiscalizadores, que teriam competência para a efetivação desse controle.